quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Pelo direito de ser infeliz o/

Às vezes eu fico me perguntando se as pessoas são realmente felizes o quanto elas dizem que são. Vejo pessoas cuspindo felicidade pelas redes sociais e isso causa em mim certo estranhamento. Você escolhe as melhores fotos dos melhores dias, as melhores poses, os melhores lugares, só pra mostrar que você é sim, muito feliz, como as famílias nos comerciais de margarina. Sinto-me envergonhada, em alguns momentos, quando olho minha página no orkut e o que vejo ali é algo falso que não condiz de maneira alguma com a minha realidade. Então, eu penso um pouco, e talvez seja assim com os outros também. Não sei ao certo, mas parece que há uma necessidade de demonstrar uma estabilidade emocional extremamente irritante. A consequência disto é que estamos perdendo o direito à infelicidade.

Vamos amigo, levante a cabeça, você é forte, existem pessoas com problemas maiores, vamos meu querido, sacuda essa poeira dos ombros e dê a volta por cima. Quem nunca ouviu um desses conselhos? Já é típico. Fico rindo algumas vezes quando alguém vem desabafar comigo e falar de suas tristezas e a única coisa que digo é: é assim mesmo. Pois é, é assim mesmo e essa não será a última vez que a vida vai te deixar de cabeça pra baixo. Aprenda a sofrer.

Odeio quando as pessoas rejeitam sua dor e te suprimi de expressão. Deixam-te sem graça para ser triste. Esse tipo de atitude vem se espalhando de uma forma assustadora. Não é permitido sofrer. Fala-se muito em tirania da beleza, mas a tirania da felicidade?

Na atualidade a mensagem que vem sendo passada é a de que a felicidade é um direito irrevogável ao ser humano. Nós merecemos ser felizes. Porém, na realidade, as coisas não são assim. Viver é um risco sem garantias. Não somos merecedores de nada. Temos que lidar constantemente com o imprevisível e isso significa que não podemos controlar os fatos que ocorrem na nossa vida. Consequentemente iremos sempre nos surpreender e ter que sair de uma posição de conforto para outra onde há a falta de sentido. Estamos sempre nos reinventando, ou seja, o tempo todo em mudança vivenciando os mais variados tipos de emoção. A felicidade é uma meta que nunca será concretizada plenamente.

Dessa forma, é como se o sujeito estivesse constantemente engasgado sem poder falar sobre suas dores, frustrações e sofrimentos. Essa cultura do hedonismo e da juventude feliz e eterna está sufocando e mascarando cada vez mais as pessoas. É como se o indivíduo vinhesse ao mundo com um único dever e este é de ser feliz em tempo integral. Não se pode reclamar da vida. "Olhe para o lado e veja que a vida de outro alguém está em pior condições que a sua, então, não reclame, não é justo." Pronto. Assunto resolvido. Acabou, não se fala mais nisso. Parece que estamos sempre ouvindo aquela frase dita pelas mães aos filhos que choram irritantemente: "engula o choro". Pois é, desde cedo aprendemos a suprimir nossas emoções e a falsear nossos sentimentos para nos encaixarmos em um padrão de vida que não se encaixa em nós.

Ser feliz tornou-se um dever, mas acontece que a felicidade é um estado de espírito que é incerto e inconstante. E essa é mais uma exigência social que ultrapassa a capacidade do ser humano. O que vejo por aí são sujeitos perdidos nesse jogo de quem ri mais e simplesmente não conseguem lidar com a dor que habita o peito e não se sentem no direito de derramar algumas lágrimas pelas agruras do dia-a-dia que tanto machucam sua carne cansada. Essa ditadura da felicidade é produto do ideal cultural de nossa sociedade. Seus efeitos são bem maiores do que isso que expresso com poucas palavras e uma pitada de ingenuidade, admito.

Cada vez mais vejo que as visitas aos consultórios terapêuticos e os transtornos mentais vem aumentando e isso é um sintoma dessa postura de repressão das lágrimas e reclamações. A nossa única saída é recorrer aos especialistas da dor e aos becos escuros de nossa mente.

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