quinta-feira, 26 de março de 2015

Teu corpo suado me lembra o mar.
Salgado.
Navego entre as águas
e descubro novas ilhas.
Onde descanso e me reencontro.
Nele mergulho e deixo-me afogar.
Sufoco.
Perco os sentidos.
Desfaleço no teu abdômen ondulado.
Renasço na força dos teus braços.
E impulsionada pelas tuas coxas
Ressurjo em mim e para mim.

Faço-me cachoeira e desaguo em ti.
Sou batizada nas águas que escorrem de nós.

Maria dos Prazeres.





 

quarta-feira, 25 de março de 2015

Posso falar de coisas boas aqui?

"É! Tem que terminar com alegria."

Ouço essa frase de uma cliente ao terminarmos a sessão fazendo piadas. Quando ouvi a frase, pensei de imediato, "Opa! Não é bem assim." e depois fui tomada pelo pensamento, "E porquê não?". 
 

A psicologia trabalha com a subjetividade humana. Durante a graduação vamos aprendendo sobre os afetos que permeiam os comportamentos humanos e se entrelaçam com a percepção do homem sobre si e o mundo. Ao longo do curso somos inundados da complexidade da existência humana repleta de sentidos singulares, diversos e dinâmicos. O sofrimento humano é para nós fonte de crescimento e possibilidades. Compreendemos que esse aspecto da vida humana é inevitável e que precisamos lidar com ele. Lembro que uma professora num certo dia disse que sabia que a terapia estava caminhando bem quando o cliente saia chorando da sala. Escutei isso no 2º período e acredito que durante a minha graduação essa ideia prevaleceu e criou raízes no meu modo de encarar o processo de psicoterapia. Até agora.

Perceber que o cliente sai mobilizado da sessão é sinal de que algo está sendo remexido, questionado, repensado. É difícil permitir que o cliente sinta e permaneça nesse estado de inquietação e angústia que poderá proporcionar descobertas e reconfigurações de posições na sua vida, mas compreendemos o valor desse momento. O sofrimento é algo fundamental. No entanto, acredito que estamos perdendo de vista a importância dos sentimentos positivos na configuração de uma sessão psicoterapêutica. 

Tem que terminar com alegria, e porquê não? Ver que a cliente apesar das suas problemáticas e sofrimento, naquela sessão específica terminou leve e sorridente. Pegou o elevador com o rosto convidativo. Deu-me um abraço apertado e sinto que um novo fôlego foi dado para a sua semana. Que a sessão para ela seja o espaço de reencontrar o encanto de sorrir com uma piada. A vida não é só sofrimento e que essa dimensão possa ser percebida também em uma psicoterapia quando se rir das dores ou dos nossos ridículos.


O percurso de estudo de um psicólogo é pautado na busca da compreensão do sofrimento humano e das diversas problemáticas que isso pode causar para o sujeito. Falamos imensamente sobre tristeza, depressão, abandono, solidão, angústia, rejeição, raiva e etc, mas pouco nos é colocado sobre a alegria, felicidade, amor, amizade, sentimento de pertencimento e tantos outros. Esse aspecto da existência humana vem se diluindo no cuidado do psicólogo. Lembro de uma outra cliente que sempre me pergunta se pode falar de coisas boas na sessão, ou lá é apenas o lugar de falar sobre seus problemas e dores. "Como assim?", eu penso. A psicoterapia fica com a imagem de ser um espaço de dor, quando na verdade é o contrário, ou pode sê-lo. Fazer psicoterapia é (re)encontrar a relatividade da vida. O quanto ela é bela e cruel. O quanto a vida é dinâmica e transformadora. É espaço de reconstrução de sentidos. E sim, ela pode terminar com alegria, não há nada de errado com isso. Que hoje possa ser terminada com um riso. Na próxima a gente vê por onde ela caminha. Assim como na vida, que a cada momento desfrutamos de uma emoção e aprendemos a encarar o dia a dia com seus desabores e delícias. 


Página no Facebook: Psicoterapia, fale mais sobre isso... (https://www.facebook.com/psicoterapiafalemais)

Foto: Cayo César (https://www.facebook.com/fotografiacayoce) e Jonas Araújo (https://www.facebook.com/jonasaraujofotografia)


quarta-feira, 18 de março de 2015

Catarse

Não quero dormir. Surgiu em mim um incomodo que não se aquieta com a paz do sono. Sabe aquela agonia que toma conta de quem tu és? Completa a ti e preenche teus espaços. Uma agonia inominável que revira tuas ideias e inquieta tua estabilidade de acreditar que estar tudo caminhando bem e tranquilo. És tocada. Fui tocada. A escrita elabora para mim esses sentimentos que não cabem nas palavras. A minha cabeça logo dói. Ela responde à minha ausência de entendimento. Escrever, para mim, é poder fugir da lógica. É brincar com os sentidos. Minha fala é rasa. Minha escrita sobrevoa e mergulha de cabeça. Falando em cabeça, como ela dói quando meu ser é acalentado pela emoção inominável. Fico vazia de respostas. As perguntas escorrem pela pele. Inundam meu paladar. Perceber essa falta é desesperadora. As perguntas e suas incompletudes. A vida e suas ausências. A vida e seus desdobramentos. A vida e seus encantos. O medo de estar passando por ela sem saborear tudo o que pode. A ilusão de ter o amanhã para poder fazer melhor. Não há tempo, mas preciso acreditar que sim. Precisamos. A esperança nos alimenta e nos engana. O futuro não existe e por isso mesmo é o futuro. Agora, desvio-me do que me apavora, pois foco no que há de seguro para mim, ou no que acredito que seja. Respiro e a cabeça alivia. Talvez esteja chegando a hora de dormir.

quinta-feira, 12 de março de 2015

segunda-feira, 9 de março de 2015

Psicoterapia, fale mais sobre isso...

 

A clinica psicológica é o lugar de uma escuta acolhedora, mas o que isso significa de fato? A psicoterapia é um espaço de confiança, entrega e descoberta, mas o que isso quer dizer exatamente? 

Venho questionando o sentido de um serviço psicoterápico, suas possibilidades e limites. Hoje pude perceber o quanto é comum ligarmos à terapia psicológica o conceito de mudança. Quando procuramos esse serviço, geralmente, somos levados a pensar nas mudanças que desejamos para a nossa vida. Fazer psicoterapia está ligado ao desejo de transformação. Mudança é a ambição de muitos que chegam até nós, no consultório. No entanto, proponho uma outra palavra.



Antes de promover mudanças é preciso que um espaço terapêutico proporcione aceitação. Uma escuta acolhedora significa possibilitar ao outro a expressão de suas verdades sem julgá-las e não impor novos valores ao cliente. A partir dessa perspectiva, o sujeito poderá se abrir e revelar-se a si mesmo. Escutar o outro nas suas verdades sem subjugá-lo não é algo comum em nossa sociedade. Pense, em quantos lugares/relações você se sente a vontade para falar sobre tudo o que pensa e sente? Em quantas relações/lugares você se sente aceito por quem é e não por aquilo que parece ser? Recebo diariamente pessoas que jamais se sentiram escutadas verdadeiramente nas suas vidas. Poder se expressar genuinamente é uma dádiva. É libertador ter um espaço onde podemos nos aliviar de nossos papéis, máscaras e amarras.

Alias, proponho uma outra pergunta para reflexão, você se aceita como se é e não como quem gostaria de ser? A aceitação não parte apenas do psicoterapeuta, mas é preciso questionar se nós antes de desejarmos mudar, nos aceitamos como somos. E qual a diferença que isso faz? Poder aceitar-se é uma mudança impressionante. Nossos conflitos com nosso modo de ser no mundo tendem a se dissolverem. Nos ampliamos. Quando nos descobrimos e entendemos a nós mesmo, podemos tomar decisões mais coerentes com nossos desejos e nos tornamos mais conscientes e respeitosos com nossa pessoa. Aceitar-se é uma grande mudança para o homem contemporâneo.



Estamos tão inquietos com quem somos que buscamos mudar sem nem ao menos tentar nos entender e procurar descobrir nossas motivações para sermos o que somos. Nossos comportamentos não são desligados de nosso ser, eles representam desejos, necessidades, sentimentos e uma história de vida. O processo psicoterápico nos ajuda a nos descobrirmos e para isso é necessário nos entregarmos em uma relação de confiança onde existe aceitação e não julgamento. Quando nos descobrimos podemos escolher se mudamos ou se permaneceremos o mesmo. Na realidade, possivelmente, não fará tanta diferença assim, pois alcançaremos um estado de ser que não se impedirá mais. Estaremos nos permitindo a viver cada situação do seu jeito particular. Sem ensaios, sem culpas, sem preconceitos. Teremos assumido as rédeas de nossa história. Aceitação, a palavra-chave de uma psicoterapia. Usando as palavras de Carl Rogers,

“A experiência mostrou-me que as pessoas têm, fundamentalmente, uma orientação positiva... Acabei por me convencer de que quanto mais um indivíduo é compreendido e aceito, maior tendência tem para abandonar as falsas defesas que empregou para enfrentar a vida, e para progredir num caminho construtivo.”

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quarta-feira, 4 de março de 2015

Quando brinco, eu SOU.


Alguns dias atrás assisti ao documentário Tarja Branca - A revolução que faltava. Esse fala sobre o ato de brincar e a sua importância para a natureza humana. Fui inquietada em diversos momentos e sobre variadas questões, mas principalmente no que se diz a respeito do brincar. Com o documentário comecei a questionar um pouco mais esse aspecto do humano. Noto que costumeiramente estamos interligando o brincar à uma atividade, ou seja, brincar implica em exercer uma atividade lúdica e essa leva o nome de brincadeira ou jogo.

No entanto, penso que muito mais do quê o exercício de uma atividade, o brincar é um estado de espírito que se caracteriza pela espontaneidade, inteireza e expressão genuína do ser. O sujeito que se coloca a disposição para experimentar e ser criativo, estar brincando. Em outras palavras, o simples exercício de uma atividade lúdica não se caracteriza como brincar, mas sim quando eu me encontro em um estado de abertura para ser livremente espontâneo, inteiro nas minhas relações e com respeito às minhas manifestações pessoais. 

Brincar é estar em contato consigo mesmo e aberto para receber o outro como ele é. É estar disponível. No campo do trabalho o brincar é mal visto, pois é reconhecido como bagunça e sem seriedade. Porém, aquele que brinca no seu trabalho desempenha suas tarefas com mais criatividade e prazer. Ele não para de exercer suas funções predeterminadas, mas as encara de um modo diferente. Brincar é abrir-se para o novo, na verdade, brincar é perceber o novo na rotina desgastada do dia-a-dia. Brincar é inovar-se. E como está faltando dentro do ambiente de trabalho essa leveza de poder se renovar na rotina e de reescrever novos sentidos para as atividades. Faltam pessoas criativas, inovadoras, espontâneas e encantadoras no campo do trabalho. Sim, o encantamento, brincar é encantar-se e encantar. Alguém que brinca encanta o outro para animar-se também. Convoca o outro a se colocar de modo mais apaixonado nas suas atividades. 

Ambientes que procuram extinguir de seu meio o brincar, são lugares que não dão espaço para o ser. Ambientes assim minam a subjetividade do homem. Estão mecanizando os sujeitos, robotizando-os, pois brincar é ser a si mesmo. O trabalho e a escola são ambientes que na atualidade veem mortificando o ser.


Brincar é fundamental, pois coloca o sujeito em contato consigo mesmo. Na brincadeira não há tempo para ensaios. O sentir, o pensar e o agir estão completamente interligados. Só há o agora. A criança entende isso, e mais uma vez digo que vai além do exercício de um jogo, é um modo de existir. Pense, alguém que não brinca tem um modo de vida engessado, endurecido, está preocupado em controlar as situações e não se arrisca, não se entrega, não se experimenta, não conhece as possibilidades de seu potencial. Brincar é liberdade. 

Quando somos brincantes estamos abertos para descobertas. Experimentamos, nos arriscamos, cometemos erros, reaprendemos constantemente, duvidamos e criamos. Quando somos brincantes estamos abertos para a vida. Brincar é vida.


O céu que arde na terra.

Celeste nasceu em noite estrelada. Filha única de um casal maduro que já havia perdido a esperança de procriar. Celeste nasce como um milagr...