Um dia
desses fui levada despretensiosamente a pensar mais uma vez em psicoterapia.
Foi bastante interessante como as coisas ocorreram. Pensando em Jung, diria que
não foi coincidência. Depois de certo tempo finalmente me propus a ler um
artigo no blog de meus professores Joaquim Cesário e Marcos Creder, o
literalMENTE (http://literalmente-literalmente.blogspot.com.br), intitulado
"Raízes psicológicas da psicoterapia: Anatomia de uma relação" de
autoria do primeiro. Porém, antes de lê-lo fui presenteada pelo meu amigo Lucas
Garcia com um belo curta metragem chamado Out of Sigth. A partir disso fiquei
impulsionada a escrever um pouco mais sobre psicoterapia.
Fiquei
encantada com a trama do curta e decidi juntá-lo às ideias do texto e organizar
sob meu ponto de vista. Para tal é necessário falar um pouco sobre o vídeo, no
entanto indico ao leitor que o veja antes, por isso aqui está o link do mesmo:
http://www.youtube.com/watch?v=x6dnqnsdBOg&feature=plcp. Ele foi o trabalho
de conclusão de curso de três estudantes da Universidade Nacional de Artes de
Tawain e relata a história de uma jovem cega que após ser roubada e largada
pelo seu cão guia vê-se sozinha e com o mundo todo a sua frente para ser
descoberto. Ela empreende uma busca ao seu animal de estimação e instrumento
facilitador de locomoção e socialização, e nessa aventura descobre um universo
encantador. Passa a ter experiências novas e prestar atenção a tudo que a
rodeia. Os seus sentidos são despertados e sua imaginação pinta o mundo a
maneira que lhe parece ser correta. Ela passa a vivenciar as coisas de forma
intensa, porém no momento que reencontra seu cachorrinho tudo volta ao que era
antes: as cores se apagam, a sua criatividade se dissipa e a cidade assume a
sua forma original.
Com o enredo
do vídeo podemos discutir dois pontos que acredito serem primordiais em
psicoterapia. O primeiro diz respeito ao desenvolvimento da independência do
cliente sobre a figura do psicoterapeuta e o segundo se refere aos
profissionais que se escondem atrás de técnicas e permitem que estas sejam a
sua bússola.
Quando se busca
uma psicoterapia se vai atrás de respostas. Respostas que possam causar
mudanças, respostas que consigam acalmar a tempestade emocional que inunda cada
um. Existe a crença que aquele que está ali nos “esperando” possui as soluções
para as aflições daqueles que o procura. Algumas vezes a esperança é depositada
mais na figura do psicoterapeuta do quê em si mesmo. Inicialmente esse processo
é interessante, pois colabora com a criação do vínculo terapêutico e na
confiabilidade do cliente. No entanto, não se deve cultivar tal comportamento. Para
maiores esclarecimentos, profissional algum possui a fórmula mágica que irá
transformar a vida do solicitante. Não há modelos. Não existe nenhum livro de
cabeceira que dê a nós, psicólogos, o dom de transmutar os problemas alheios em
lembranças engraçadas e em material de experiência de vida, apesar de ter aqueles
que carregam tal ilusão.
Retomando
então ao curta citado a cima, quero dizer que alguns indivíduos entregam aos
terapeutas o poder de guiarem suas vidas. Deixam-se ser levados pelos conselhos
e opiniões bondosas dos profissionais que lhe acolhem, o que é um engodo de
ambas as partes. Tais sujeitos dependentes delegam a habilidade para lidar com
seu dia-a-dia e esperam ansiosamente até a próxima sessão onde poderão pensar
sobre seus assuntos. A responsabilidade pela construção de sua história foi
deixada em alguma esquina da cidade ou em algum cantinho do consultório
terapêutico. Deixam de experimentar o mundo da sua forma singular e passam a
perceber os fatos com os olhos dos profissionais que os atendem.
Não digo que
agir contrário a essa postura impedirá que obstáculos surjam no caminho, em
ambas as posições não há seguranças, os dois modos são arriscados, afinal de
contas viver é um risco. Porém alguns
podem dizer que carregar sobre os ombros suas próprias decisões é muito
desgastante. Concordo. No entanto o enriquecimento pessoal e o prazer
irremediável de ser o principal autor de sua história, não tem preço. É uma experiência assustadora, admito, mas é fascinante descobrir-se. Vale a pena tentar.
Quanto ao
segundo ponto, a instrumentalização da psicoterapia, pode-se afirmar que esta
cega o profissional e o impossibilita de fornecer o melhor de si para o
cliente. A ferramenta mais importante que o profissional possui é a sua própria
subjetividade. A maneira como o cliente o toca, a relação estabelecida, trabalhar
no que há entre e não unilateralmente, respeito pela singularidade e a criação
de um vínculo de confiança são os instrumentos mais válidos no setting
terapêutico. Um psicoterapeuta que não leva em consideração as repercussões que
ocorrem dentro de seu ser terá dificuldade de escutar o outro e de possibilitar
que o mesmo se escute. Terapia não se desenvolve em um indivíduo, é uma troca
que ocorre dentro de uma relação assimétrica, porém sincera e coerente com suas
finalidades.
Teoria e
técnicas são importantes. São recursos sérios que moldam e possibilitam a
profissionalização. No entanto, como diria Jung em sua célebre citação: “Conheça todas as teorias, domine todas as
técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.
Assim, observando o curta, posso dizer que o psicoterapeuta que se refugia em
técnicas bem estruturadas e pratica terapias instrumentalizadas, vazias de
interação, perde a criatividade e torna o espaço terapêutico um vácuo onde o
sujeito fica em segundo plano e o que se vê são apenas os jogos sociais e a
superficialidade do ser que não transmite a verdade do indivíduo.
A
visualização do curta desperta, ao menos em mim, diversos sentimentos e um
questionamento: Até que ponto o cão guia estava colaborando com a garotinha?
Refletir sobre o nosso papel com o outro é fundamental, e digo para aqueles que
se vangloriam quando escutam da boca de algum profissional que não precisam se
responsabilizar com as escolhas e o processo do cliente, que não cabe a nós nos
devorarmos com os caminhos tomados pelo paciente: Parem e pensem qual a nossa
função e, principalmente, não se acomodem com essa defesa. A responsabilidade é
ainda maior devido a isso.
“Um dia eu quis ver o mundo, porem não consegui. Outrora quis olhar, mas não pude. No ultimo dia desejei enxergar, então fechei os olhos e imaginei.”
ResponderExcluirAdorei o texto Crispim, achei muito bom você ter trazido um tema referente ao manual inexistente que muitos psicólogos se apoiam. Você foi muito feliz ao fazer a analogia com a transmutação, a qual os alquimistas tanto trabalharam e de certo modo nunca alcançaram.
Muito Obrigada pelo comentário e mais uma vez pelo curta. Manda mais pra mim quando tu encontrar essas joinhas ;D
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