É comum ouvir na clínica o incômodo
que os clientes sentem ao perceberem nas redes sociais o quanto as vidas dos “amigos” são
repletas de emoções e felicidade, enquanto que as suas são “uma grande merda”. Para
eles, notar essas diferenças traz insatisfação com o modo como andam organizando
suas histórias e lhe impulsionam a buscar algo semelhante. Preocupam-se com a
imagem que lançam para o mundo. Perturbam-se com os possíveis comentários
que os outros possam fazer sobre quem são.
Vivemos para postar. Nossa rotina, nosso dia, nossa vida virou artigo de divulgação. Aquele que aparece tem mais reconhecimento. É através da visibilidade que estamos conquistando respeito e afeto. Precisamos, atualmente, sermos bons divulgadores de nós mesmos. Construir uma imagem que seja comprada, ou melhor, curtida e compartilhada. Estamos mais preocupados na construção de um ideal publicitário do que na atualização de nosso verdadeiro potencial.
Cada vez mais nos afastamos de nós mesmo em busca de sermos alguém melhor (melhor pra quem?). Não podemos sofrer. Não podemos sentir tédio. Jamais podemos sentir inveja, orgulho ou raiva. Só é permitido a felicidade. A felicidade do espetáculo. Daqueles que curtem a vida. Que estão sempre sorridentes nas mídias sociais.
O homem
que não assume a possibilidade inevitável de sofrer durante a vida se
fragilizará e se manterá numa postura infantil diante das adversidades. O
homem, hoje, parece sofrer por não conseguir escapar do sofrimento. Sofremos
por não estarmos constantemente felizes e desfrutando dos diversos prazeres
vendidos na contemporaneidade. Sofremos por estarmos jogados no mundo e não
fazermos a menor ideia do que fazer com uma vida que não é aquela ofertada
pelas redes sociais e publicidade.
Parece que no presente as pessoas estão construindo seus projetos de vida baseadas no
grande espetáculo oferecido pelas mídias e, consequentemente, encontram a infelicidade por acreditarem que ser feliz é aquilo lá, que os outros
sentem e não isso aqui que estou sentindo. Estamos dando à felicidade um status
comercial que não se cumpre na realidade. Estamos matando a felicidade por não
aceitá-la como ela é - comum e passageira.
E o que
isso tem a ver com a queixa dos meus clientes? Ao se orientar por uma
aparência, por um jogo de marketing, eles se distanciam de si cada vez mais, pois
fogem de seus vazios, de suas tristezas, de suas invejas, de suas faltas e consequentemente da
felicidade. Quanto mais eles se esforçam para serem felizes, mais tornam-se infelizes,
pois suas tentativas só mostram o quanto se encontram imersos nesse jogo performático. Como reflete o poeta Rilke (2001) “Por que deseja excluir de sua
vida toda e qualquer inquietação, dor e melancolia, quando não sabe como tais
circunstâncias trabalham no seu aperfeiçoamento?” (p.70) e continua “Desejava
algo melhor que transformar-se?” (id, p.70).
Pense, o que de fato você deseja? E para quem você vive? O que você busca?
Referência bibliográfica.
RILKE, Rainer Maria. Cartas a um jovem poeta e A canção de amor e morte do porta-estandarte
Cristovão Rilke. São Paulo: Globo, 2001.
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