quinta-feira, 21 de abril de 2011

Uma vida desconhecida.


Você ligou na hora errada. O dia está incorreto. Não tive coragem para falar. Como pode ter esquecido o dia em que me viu pela primeira vez? Como não lembra do dia em que meus pulmões conheceram o ar? Nesse dia eu cheguei ao mundo e você estava lá. Você me viu chegar. Pegou-me em seus braços. Sentiu meu cheiro e meu hálito. Riu da minha cara engraçada. Procurou, e encontrou detalhes no meu rosto que eram seus. Você estava lá, eu sei. Então, como pôde se enganar?

Estavas presente na chegada, mas no percurso ficaste ausente. Perdeu de me ver no mundo. A oportunidade de me acompanhar na escola passou. Meu primeiro beijo. Minha primeira menstruação. O primeiro dez e aquele zero. Aquele machucado que deixou uma cicatriz no joelho. O jogo de vôlei e o porre depois da vitória. Ficou tudo perdido no tempo. Sem chance de resgate. Quantas lágrimas foram invisíveis aos seus olhos? Quantas gargalhadas foram surdas aos seus ouvidos? Será que ao menos tem ideia de como é meu rosto? Qual é a cor do meu cabelo? Minha altura? Tem noção de quanto é? Meu número de sapato e roupa? Alias, sou gorda, magra ou meio termo? Tem ideia de quem eu sou? Se eu passasse ao seu lado na rua me reconheceria? Em mim tem um pedaço seu que não posso evitar, mas não há em ti nada que seja meu. Como pôde ter esquecido o dia em que seus olhos brilharam ao me ver? Você ligou no dia errado. Não falei nada. Não tive coragem.

sábado, 16 de abril de 2011

O que é isso que vejo? Quem é essa que está em meu lugar? O espelho refleti o que eu não vejo. Ele alcança onde meus olhos não conseguem chegar. O que há? Esse espectro visual não contempla quem eu sou e muito menos quem eu quero ser. Deve haver algo errado. O espelho está com defeito. Vou trocá-lo.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Peso do vazio.

A minha mochila está pesada. Olho para dentro em um busca de algo que possa remover e o que encontro é o nada. Ela está vazia, e perceber isso me paralisa. O que tenho para colocar nela não preenche esse espaço. É inevitável, fico parada. Espero que passe diante de mim qualquer coisa que eu possa agarrar e fingir ser suficiente. Não há saída, tenho que deixar tudo de lado e me deixar carregar pela mochila. É a única forma de se movimentar, só não sei por quanto tempo vai funcionar.

O habitual tornou-se estranho.

O tempo passou, porém você ficou estático.
Você é um mero recorte daquele momento.
Algo que não se aplica mais na realidade.
A sua voz é a mesma. A minha capacidade de ouvir diminuiu.
O seu gosto ainda é o mesmo. Meu paladar se refinou.
Aquele cheiro só seu, persiste. Preencho a casa de incenso.
O olhar distante que me fazia enxergar longe continua existindo.
 Apenas não procuro mais respostas dentro dele.
O seu toque é leve, como antigamente. Minha pele se enrijeceu.
Sua risada é por si própria engraçada, porém tornei-me séria.
Você ficou em um tempo que não sou mais eu.
Você se transformou em uma lembrança imediata.
Não consegui deixar para trás a vontade de crescer.
Eu andei e você ficou na estrada que nós caminhamos sem sentir.
Andei sobre ela, já você se deixou ultrapassar.
A estrada passou por ti, e você nem viu.

O céu que arde na terra.

Celeste nasceu em noite estrelada. Filha única de um casal maduro que já havia perdido a esperança de procriar. Celeste nasce como um milagr...