"(...) cada um tem sua historia. Eu estou aqui pra aprender, não pra julgar. Quem pode me julgar?"
Esse pequeno trecho da música O preço, do grupo Charlie Brown me remeteu a um aspecto que vem crescendo em nossa sociedade: a falta de padrão para uma conduta social. É como se na atualidade não houvesse mais algo que está acima de nós e que de certa forma norteia os comportamentos. Tudo é permitido. Tudo é legítimo. Todos os desejos são dignos de realizações. Diminui-se os limites entre um e outro e ao mesmo tempo há o afastamento dos indivíduos na contemporaneidade. Pelo que me parece as fronteiras do bem e do mal estão se dissolvendo.
Um pressuposto fundamental na minha profissão, a psicologia, é a suspensão dos julgamentos. Devemos ouvir o indivíduo em sua verdade sem a pretensão de julgá-lo ou condená-lo. Porém, a sociedade, de forma geral, não pode se abster dessa atividade, pois se não houver julgamento de espécie alguma o caos será instalado.
Para Freud, a vida em grupo é possível, pois o ser humano abriu mão de uma cota de felicidade por segurança. Isso se fez graças a um conjunto de valores, leis que delimitava os comportamentos dos sujeitos. Na atualidade, esse conjunto de regras, reconhecido como o Estado está falindo. Dessa forma, fica vago o lugar daquilo que dá uma base de conforto e segurança para a vida coletiva.
Com isso, vemos a necessidade da criação e re-criação de contratos sociais em camadas mais superficiais para a configuração de uma conduta social mais adequada e condizente com o ambiente frequentado. Estando vazio esse lugar do Estado, outros grupos e compartimentos da sociedade estão se vendo obrigados a tomar o lugar de julgadores para que assim se possa manter um pouco de ordem.
A cada dia mais fica difícil promover o julgamento a cerca de uma situação ou manifestação, pois "Quem pode me julgar?". Está frase parece até uma súplica da contemporaneidade por esse lugar de referência, controle e limite. Essa ultrapassagem de limites vivida pela sociedade atual é apontada como um dos maiores problemas a ser enfrentados, pois sem contenção não há eu, não existe outro, não há mundo. Tudo fica misturado. A realidade se transforma em um grande playground onde tudo é possível.
Nesse instante estamos vivendo a deriva esperando encontrar uma bússola que nos guie e nos proteja da imensa multiplicidade de ser humano.